Lattes

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Orquestra Universitária da USP de Ribeirão Preto: ação e reflexão na prática orquestral

ORQUESTRA UNIVERSITÁRIA USP-RP
Aulas: quintas, das 19h às 22h e sábados, das 9h às 12h. Local: Sala de Concertos da Tulha/USP-RP.
Repertório para o I semestre de 2011: Sinfonia # 99 de Haydn.
Reinício das atividades dia 24/02/2011, quinta, às 19h, na Tulha (campus da USP)


"reconstruir los repertorios y reconvertirlos en algo vivo"

(Castilla, 2010)

Estudos recentes vêm abordando a formação orquestral como um palco de disputas sociais internas, presentes em qualquer instituição humana. Este olhar revela o que não se vê no concerto e, para muitos, macula a imagem santificada do pódio, dos músicos "vestidos como pinguins" e do maestro liberando sons maravilhosos com seus gestos eloquentes, sua batuta de toneladas e sua cabeleira contumaz.

Não fossem as implicações políticas deste ou daquele "figurão", tecnicamente uma orquestra poderia funcionar num sistema de rodízio entre a estante e o pódio, com seus instrumentistas revezando-se na arte de coordenar os ensaios e presidir a apresentação pública, já que ninguém melhor do que o próprio instrumentista para saber o que funciona em termos de gerenciamento, leitura, interpretação e performance.

Desde 2008, a Orquestra Universitária da USP de Ribeirão Preto vem tornando possível a alunos do mais novo departamento da FFCLRP, estudantes de música em geral e músicos amadores autogerirem a prática orquestral, participando da escolha do repertório, candidatando-se a solistas ou regentes e compondo obras sinfônicas. Aberta a todo e qualquer interessado, a OU recebe novos integrantes durante todo o ano letivo e seus monitores — bolsistas das pró-reitorias de Graduação e de Cultura e Extensão — asseguram o aperfeiçoamento e a reciclagem técnica de seus participantes, com ensaios de naipe e atendimentos individuais.

Se para cantar em coro, o repertório renascentista é fundamental para a educação vocal, numa orquestra, o classicismo vienense, de Mozart, Haydn e Beethoven, é que vai esculpir a sonoridade sinfônica, equilibrando sopros, cordas e percussão, e criando uma cultura musical diferente da banda sinfônica que tem outro perfil. Dessa maneira, a orientação da OU é realizar uma sinfonia vienense por semestre, além de programas mais "portáteis" com o naipe de cordas, que se aperfeiçoa através dos concertos barrocos de Vivaldi e Telemann, entre outros.

A OU tem participado ativamente da vida acadêmica, com apresentações em eventos do campus, entre eles a Semana da Composição, o Siicusp etc, sempre sob a regência de seus alunos, e contará este ano com a participação de professores solistas ou convidados para regê-la.

Toda partitura representa uma vivência que precisa ser reconstruída. Haydn reclamou certa vez de ter que compor para um mosteiro distante, de onde não conhecia nem o local nem os músicos. Acostumados, hoje em dia, à repetição de uma obra em diferentes contextos, podemos nos atrever a modificar ou adaptar uma partitura à nossa realidade. Na OU, devido à escassez de trompas na região, essas partes são realizadas por trombones na região aguda (tocados de maneira adequada) e pelo bombardino, um parente próximo. Os andamentos também se adequam ao nível técnico dos instrumentistas e é preferível, por exemplo, fazer o I movimento da 8ª de Beethoven um pouco mais lento, mantendo sua inteligibilidade e transparência, do que respeitar a primeira indicação metronôminca do autor e obter um resultado desastroso ou confuso.

Essa reconstrução do repertório tem como objetivo a democratização do cânone e a abolição do esnobismo que impede uma relação de vida e amor com o patrimônio musical clássico. Quando um aluno compõe uma obra para a OU, ele participa das aulas e conhece por dentro seu funcionamento, suas limitações e qualidades. Disso resulta uma adequação a seus quadros e uma participação ativa no produto final, devolvendo ao músico a possibilidade de valorizar todas as etapas do processo artesanal da produção musical.

Desde o século XVIII, a inserção da música na universidade enfrenta problemas com vaidades e disputas — obstáculos para uma prática verdadeiramente acadêmica que inclua a pesquisa, a docência e a extensão dos conhecimentos à comunidade — , e permanece muitas vezes como simples associação promotora de concertos em vez de atuar como celeiro de potenciais vocações que sejam preparadas para atuar no mundo profissional de forma esclarecida e consciente e participar futuramente de outras formações que visem a um alto nível técnico e artístico.

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